Curso 01 – Aula 02 – A relação dos jogos com a mente

Nesta segunda aula do curso de game design eu irei comentar sobre a relação entre os elementos dos jogos e a mente humana, a experiência vivida pelo jogador ao entrar em contato com enredo, imagens, desafios, dinâmicas, sons, etc, dos games. Não utilizarei uma abordagem profunda, visto ser este um curso de introdução, mas o suficiente para que você tenha uma idéia inicial sobre questões que envolvem psicologia e filosofia na interatividade lúdica.

Apesar de este ser um tema teórico, ele tem grande impacto na prática da criação de um jogo. O estudo teórico se dá exatamente em cima de fatos empíricos da relação entre o jogador e o game e também da mente com o universo de uma forma geral. Isso porque a mente se relaciona com tudo, o tempo todo, o que inclui os jogos e seus elementos. Os jogos seriam um ‘universo’ dentro do universo, com os quais a mente interage de várias formas. E quando falo de jogos, me refiro a todos os tipos, não apenas aos digitais mas também aos jogos de tabuleiro, aos vivenciais (RPG) e aos cardgames. Cada qual com seus elementos que estimulam a mente de alguma forma.

O contato com os jogos pela mente se dá através de imersão, desafios, diversão e um conjunto de estímulos. É o que chamo de ‘experiência do ato de jogar’. A pessoa deve ter uma experiência no mínimo boa ao jogar um jogo. Quando experimentamos algo bom, queremos mais, queremos de novo, nos lembramos sempre deste algo e até compartilhamos com os demais, divulgando e elogiando este algo. Com os jogos é a mesma coisa. Uma experiência boa que o jogador tiver com o seu jogo fará ele querer jogar mais vezes e divulgar.

E o que é exatamente esta ‘experiência do ato de jogar’?

É toda a relação da pessoa com o jogo. Tudo que o jogador faz, pensa, reflete e sente do jogo. Se pensarmos o jogo sozinho, ‘estático’, podemos definir ele de uma forma X, Y e Z. Mas ao pensarmos o jogo sendo jogado por uma pessoa, ou seja, o jogo em ‘movimento’, então passamos a ter uma definição de W, Q e S. Tudo muda, pois agora o jogo passou a ser vivenciado por alguém. Existe uma diferença entre o estático e o movimento. Entre o que conhecemos no estado fixo, sem interação e movimento, e o que conhecemos através de interação e experiência vivida.

Pense em um carro. Você olha para ele e dá diversas definições. Mas quando você passa a dirigi-lo, ou seja, quando você vivencia uma experiência com ele, então sua definição muda, pois agora você está em contato direto com ele e não apenas observando-o de fora, de longe. Percebe a diferença? Sim, é questão filosófica, porém quando você passa a ter esta noção, você passa a entender melhor na prática o jogo e a relação das pessoas com os jogos.

A experiência vivida em um jogo passa pela relação da mente com as imagens do jogo, os sons, a interação do mouse, teclado, periféricos extras, com o enredo do jogo, suas regras, dinâmicas e mecanismos. Os mecanismos, regras e dinâmicas, aliás, são muito importantes, pois eles definem boa parte da jogabilidade e do padrão mental que o jogador mais irá utilizar durante uma partida. Um game digital de corrida, por exemplo, fará a mente do jogador ficar atenta aos detalhes visuais para conduzir corretamente seu carro. Já um game digital de estratégia fará a mente calcular variações e estratégias. Um jogo vivencial (RPG) fará a mente usar de sua criatividade na maior parte do tempo. E assim por diante. Os jogos exigem sempre algo da mente para jogá-los, e isso também é parte da experiência vivida por aquele jogador com o jogo.


Para observar melhor tudo isso, tente sair um pouco do parcial e veja o todo. Veja de cima esta relação entre uma pessoa e um jogo, entre a mente e os elementos do jogo. Não fique preso apenas aos elementos comuns do jogo, tais como imagem gráfica boa, etc. Tente ir além. Veja a relação. E vá além dos jogos digitais também, procurando olhar também a relação existente com os demais tipos de jogos de tabuleiro, vivenciais, etc. Ter conhecimento dos mecanismos de jogos de tabuleiro é muito importante para quem quer trabalhar com jogos digitais.

Perceba também em você próprio como os elementos dos jogos muitas vezes mexem com sua mente, mudando seus padrões de pensamento, ainda que por alguns minutos. Quando você fica horas em um mesmo tipo de jogo e sai dele, sua mente ainda se mantém naquele padrão de raciocínio por alguns minutos. Ou quando você joga por horas um jogo dinâmico e rápido e vai dormir em seguida, em muitos casos você sonha com aquelas imagens e dinâmica do jogo.

Talvez você esteja se perguntando agora: será que então os jogos violentos realmente influenciam as pessoas?

Minha resposta é sim e não. Sim na medida em que os padrões de um jogo são absorvidos pela mente de alguém sim, pois é uma experiência vivida, ainda mais quando consideramos que o inconsciente não faz distinção entre fantasia/imaginação e o que é realidade. Isso quem faz é a parte consciência, que no frenesi de muitos jogos pode ficar em segundo plano por alguns segundos em determinados momentos. Então sim, dependendo do jogo e seu grau de violência, além da forma como a experiência vivida pelo jogador foi projetado dentro do jogo, dependendo de tudo isso um jogo pode sim exercer uma influência negativa sobre uma pessoa.

Mas, ao mesmo tempo digo que não, pois influenciar não é a mesma coisa que determinar. Ou seja, um jogo pode influenciar, mas não determinar que alguém cometa algo de errado. Aqui entra o grau de consciência de cada pessoa. Entra sua estrutura psíquica. Se a pessoa tiver boa consciência, logo após um jogo destes, o padrão influenciado logo ficará de lado quando a pessoa trouxer à luz de sua consciência de que aquilo é apenas um jogo, uma fantasia e não a realidade.

Porém, realmente é possível que algo pode ficar em seu inconsciente. Mas vou encerrar por aqui este assunto, pois este é um tema complexo suficiente para ser tratado aqui. Aliás, é tema não apenas para outros pots, mas também de livros e estudos sérios acadêmicos inclusive. Não será em um ou dois parágrafos aqui que darei uma resposta definitiva e com todas as variáveis e possibilidades.

Voltando ao nosso tema principal, da relação da mente humana com os jogos, vou encerrar lembrando novamente o principal de tudo o que foi dito: perceba sempre a experiência vivida do ato de jogar. Esta experiência é que vai determinar o sucesso de um jogo, seja ele digital, de tabuleiro, etc.


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Atividade proposta:

Analise a sua experiência vivida do ato de jogar de dois jogos digitais de estilos diferentes e também de pelo menos um jogo de tabuleiro.

Escreva uma lista das sensações vivenciadas, do que eles exigiram de sua mente e de seus sentidos, as idéias e pensamentos que eles despertaram em você, além da relação entre os mecanismos dos jogos e o seu padrão mental estimulado por eles.


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Fluxo do Curso:

Introdução e Apresentação do Curso

Aula Anterior: O nascimento de um jogo
Próxima Aula: O enredo e o conteúdo de um jogo

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9 respostas para Curso 01 – Aula 02 – A relação dos jogos com a mente

  1. Paulo Viana disse:

    Peter, parabéns pelo curso e muito obrigado!!! Queria tirar uma dúvida que na verdade não é dúvida, é um comentário. Fiz a atividade proposta com dois jogos de computador (Dragon Age e o clássico Sim City) mas tive dificuldades de fazer com um de tabuleiro. Na verdade nem consegui pensar em um para fazer. Tem alguma dica para ajudar? obrigado!

  2. PeterMr disse:

    Paulo, realmente não há uma cultura de jogos de tabuleiro no Brasil, o que é uma pena. Então entendo perfeitamente sua situação e acredito até que outros possam estar passando pela mesma dificuldade. Tente pegar algum jogo que você tenha jogado bastante a ponto de se lembrar de como era, das suas reações, das reações de quem jogava com voce, o que o jogo exigia de sua mente, etc. Vou dar um exemplo: o jogo War, que é bem conhecido no Brasil. É um jogo que exige boa observação do tabuleiro, exige uma certa estratégia, além de variar momentos de tensão (a hora de jogar os dados para definir um ataque) com momentos de reflexão (na vez dos outros, voce pode pensar em estratégias, se nao estiverem te atacando naquele momento). Há momentos de risos e até momentos de raiva (quando voce tira o unico numero no dado que nao poderia tirar). Além disso é um jogo que desde o começo sempre prende sua atenção. Enfim, são algumas das relações deste jogo com a mente de quem o joga e algumas das sensações que ele causa. Tente fazer uma análise assim com algum outro jogo. Não precisa ser nada muito elaborado. Apenas descreva para voce mesmo em um papel algumas das características e perceba como que aquele jogo se relaciona com a pessoa que o joga. Abraços!

  3. Pedro Henrique A. de S. S. disse:

    Ai… gostei muito das duas aulas… espero que possas… fornecer mais aulas…
    e gostaria de lhe pedir um favor… se possível, dizer o seu nome completo, estou realizando um projeto de um game, e gostaria de por em agradecimento seu nome ao concluir.
    Mas caso você não queira tudo bem. De qualquer forma gostaria muito de lhe agradecer por tal site, e pelas aulas fornecida.

  4. Gabriel disse:

    Cara, o curso é muito legal! Tu ta de parabéns mesmo. Eu tava com dificuldade de achar um curso de Game Design. Agora que achei, eu to muito entusiasmado. Parabéns mesmo. Eu tenho uma dúvida: Tem que te entregar esses exercícios ? Vai dar nota ? obrigado!

  5. PeterMr disse:

    @Gabriel, as atividades propostas devem ser feitas em casa e somente para você mesmo. São atividades que ajudam a entender melhor na prática o que foi explicado no texto da aula. Apenas a última atividade, no final do mini-curso, é que poderá ser enviada para mim. Eu farei uma avaliação da mesma e enviarei de volta com comentários a respeito, mas sem nota. Não há necessidade de uma nota, apenas de uma análise e comentários sobre pontos fracos e fortes do mini-projeto realizado pelo participante do curso. ;)

  6. Andréa Schoch disse:

    Peter:

    Você é muito didático, achei as explicações muito ricas..
    Trabalho em uma empresa de EAD, e estamos procurando fornecedores de games para e-leraning, podes me indicar?

    Abs.

  7. PeterMr disse:

    @Andréa

    Obrigado! :)
    Vocês sao uma empresa de EAD que buscam fornecedores em que sentido? Outras empresas de EAD? Profissionais que trabalhem na área como free-lancers? Abraços.

  8. Icaro Matheus disse:

    Peter estou pensando em começar um projeto com alguns amigos que dica você me daria? ah e otimo curso estou tentando acompanha-lo sempre que possivel.

  9. PeterMr disse:

    @Icaro

    Comece sempre com algo simples. Um grande erro de 90% das pessoas mais jovens que querem entrar no mercado de games é querer produzir algo independente como se fossem empresas grandes. Já querem fazer um MMORPG, um jogo gigantesco, cheio de situações etc. Não façam isso. Comecem com algo simples, de uma fase apenas, duração máxima de 10 minutos de jogo, pequeno, mas bem projetado e desenvolvido. É importante terminar os projetos que iniciar, pois isso sim te dará experiência no projeto todo (e não apenas no seu início), currículo, portfólio, além de confiança para os projetos seguintes. Abraços!

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